“Aprendi a não desistir de mim e a gostar da minha companhia”

Meu nome é Yara. Tenho 61 anos, moro na cidade de Mamborê, com cerca de 12.900 habitantes, no interior do Paraná. Trabalho na Prefeitura Municipal e tenho três filhos: Bruna, Mateus e Yasmin, e três netos: Isaac, Enzo e Felipe.

Aos 53 anos me divorciei depois de 21 anos de casamento. A decisão partiu do meu ex-esposo. Eu achava que minha vida estava “resolvida” e, de repente, a “rota” foi mudada. Colocava minhas energias em cima do amor. Como se toda a água do meu copinho de canudo colorido dependesse daquilo para continuar me sustentando. Que besteira…

Quando nos conhecemos, meu ex-esposo e eu éramos separados. As duas filhas dele moravam em outra cidade com a ex-esposa dele e meus dois filhos moravam comigo. Resolvemos dividir a vida. Minha filha tinha nove anos; meu filho, um ano e meio. Decidimos, juntos, que meu companheiro faria a tão sonhada faculdade de Direito. Na mesma época, engravidei. Foi uma fase muito difícil financeiramente para nós. Como eu tinha uma boa renda, acabei arcando com os gastos da casa e dos filhos. Sonhávamos com um futuro melhor para toda a família e com a nossa futura aposentaria. A luta valeu. Conseguimos!

Depois de vários concursos em diferentes estados, ele passou no concurso para delegado da Polícia Civil do Paraná. Agora era aproveitar a nossa conquista! E começamos a fazer isso. Compramos uma moto e, sempre que podíamos, viajávamos em grupo ou sozinhos. Amava aquela liberdade de viajar de moto. Conhecemos vários lugares.

O inesperado mudou tudo

Porém, um dia, minha caçula descobriu a traição dele. Conversou com o pai, pediu para que conversasse comigo. Simplesmente ele disparou: “O nosso casamento acabou! Não te amo mais!”. E se foi. A parte mais difícil da separação foi a sensação de ter sido usada e descartada quando não tinha mais utilidade, ter a “consciência” da inutilidade, pois estava “velha”. Dias difíceis! Queria morrer e, literalmente, tentei provocar o meu fim. Duas vezes!

Na primeira, eu estava dirigindo na estrada. Acelerei muito o meu carro. Estava vindo um caminhão no sentido contrário. Pensei: “Está fácil de resolver e acabar com esse sofrimento. Só entrar na pista contrária e bater de frente. Pronto, acabou!”. Mas não tive coragem de continuar.

Na segunda, lembrei de uma cirurgia que eu teria que ter feito dois anos antes. Na época, estava com os exames prontos. Porém, meu ex-marido sofreu um acidente e tive que cuidar dele por dois meses. “Tá aí a minha chance. Vai que dá alguma coisa errado e consigo morrer”.  Marquei a tal cirurgia. Voltei do centro cirúrgico, tive que ficar sozinha no quarto por doze horas sem poder me levantar por causa da anestesia. Deus é perfeito em tudo o que faz. As enfermeiras vinham verificar como eu estava, mas o tempo em que eu ficava sozinha me dava pânico. E se precisar de alguém e não tiver ajuda? Foi aí que Deus agiu. Quer morrer? Está com medo de morrer? Como assim? Então, morre… Ali percebi que queria muito viver. Era só uma fase e iria passar. Passou. Tudo na vida passa. Que bom!

Passei tanto tempo de “carona”, que tive medo de escolher meu caminho sozinha. Voltar a caminhar por mim mesma foi muito assustador. Comecei a namorar quando tinha 13 anos e me casei aos 19. Então, até os 53, nunca tinha ficado ou saído sozinha em qualquer lugar. Não foi a coragem que me fez me lançar no desconhecido. Foi medo de permanecer igual. Descobri que o medo pode paralisar, como também me impelir a fazer coisas que não imaginava ser capaz.

No auge da dor, fiz umas seis sessões de terapia e tive o apoio dos meus filhos. Amigos, quando isso acontece, não sobram muitos. A verdade é que fica apenas você a maioria do tempo. Meu hobby é o artesanato, mas não conseguia fazer ou me concentrar em nada.

Doeu? Doeu. Mas, antes de doer, eu fui feliz. E aprendi. E vivi. Faria diferente? Não. Permanecer na dor é escolha. Às vezes, é decisão do ego. Depois de uma longa “apneia”, dolorosa, escura e profunda, voltei à superfície. Hoje sei que podemos nos acolher quando tudo fica sem sentido. Recomeçar é desafiador, porém necessário. Para tanto, temos que ter muita coragem e determinação. É uma luta diária que você trava com você mesma. Mas também, aos poucos, os caminhos vão se mostrando.

No colo da natureza

Sempre adorei adrenalina e natureza. As cachoeiras são meu carinho, meu cafuné.  Acordo e digo pra mim: “Hoje vou te levar passear numa “cachu”. Vamos dar um rolê”. No Paraná, a Emater, instituto que promove a agroecologia e o turismo rural, tem um calendário anual de caminhadas na natureza. Comecei a participar e ali me identifiquei com um grupo de outra cidade perto da minha. Então, começamos a fazer os nossos próprios trajetos, além de rapel, tirolesa, escalada. Fizemos, por exemplo, o Caminho do Itupava, originário de antigas trilhas indígenas, a aventura mais estressante, tanto física como emocionalmente. Às 20h ainda estávamos no meio da Mata Atlântica. Imagine só! A última aventura foi uma tirolesa de bike. Experiência surreal! Adoro tudo isso, pois é uma forma de me desafiar e ver que posso tudo quando estou disposta. Isso me dá a certeza de que estou no lugar certo.

Antes da separação me via totalmente dependente. Não no sentido financeiro, mas a dependência de ter uma companhia para poder me divertir, fazer minhas aventuras e viajar. Hoje, consigo fazer tudo isso sozinha, inclusive minhas viagens. E do modo que sempre adorei. Explico. Viajar para mim é um pouco mais difícil que o “normal”, pois não gosto de ter um hotel com dia e horário para entrar e sair. Gosto de chegar e me desafiar, encontrar um lugar e fazer meus passeios. Nessa minha nova caminhada, aprendi que nunca estamos sozinhas.

Eu zerei o jogo. Hoje sou eu quem escreve as linhas. Aos 56 anos, lembro que olhei no espelho e falei: “Você é ma-ra-vi-lho-sa!” Respirei fundo, com um “cadinho” de medo, mas fui viver, na fé!

Hoje, aos 61 anos, estou com o coração feliz e cheio de gratidão por viver todas as experiências que a vida me apresenta. Aprendi a me acolher e a ter paciência com as minhas dificuldades, mas aprendi principalmente a não desistir de mim e a gostar da minha companhia. Minha estrada tem sido tão linda. Cheia de aventuras e liberdade.

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